Talvez o diretor de Avatar tivesse alguma razão quando, no ano passado, comparou a trama de seu filme com o conflito entre o governo brasileiro e do povo da Amazônia afetado pela construção da barragem de Belo Monte. A polêmica em torno deste trabalho, há cinco dias suspensos por ordem judicial, sublinha o crescente dilema entre desenvolvimento e respeito pela vida que o gigante sul-americano está enfrentando paralelamente ao seu crescimento economicamente invejável.
O juiz federal Carlos Eduardo Castro Martins decidiu a suspensão de obras em Belo Monte para proibir "qualquer alteração do rio Xingu". O juiz respondeu favoravelmente ao recurso judicial da Associação de Criadores e Exportadores de Peixes Ornamentais Altamira, cujos membros afirmam que o desvio do rio põe em perigo a sobrevivência de milhares de famílias de agricultores.
A decisão do juiz representa uma grande derrota para o Executivo de Dilma Rousseff. Mas não é o fim da guerra, porque a decisão é recorrível e é certo que o consórcio responsável pela obra, Norte Energia, vai lutar pela revogação. Em fevereiro deste ano um tribunal revogou uma suspensão anterior ordenada por um outro juiz que achou que a agência ambiental brasileira, IBAMA, violou 29 pontos da regulamentação sobre respeito ao meio ambiente.
Se o governo ganhar o caso, Belo Monte vai se tornar o terceiro maior produtor de eletricidade no mundo, atrás da usina chinesa de Três Gargantas e de Itaipu, entre Brasil e Paraguai. A represa, cuja concepção remonta aos anos setenta e foi recuperada sob o mandato de Lula da Silva, deverá estar operacional em 2015 e oferece uma capacidade máxima de 11.233 megawatts de geração, equivalente a 11% da capacidade instalada no país. A um custo de 10.600 mil milhões de dólares, os seus promotores consideram vital para assegurar o abastecimento de energia no norte do Brasil e melhorar a interligação de redes de abastecimento de todo o país, e para assegurar o desenvolvimento económico e social uma área de alto crescimento populacional, mas com níveis muito baixos de infra-estrutura básica e da educação. Os relatórios mais otimistas prevêem a criação de 40.000 empregos durante a construção.
Grupos ambientalistas e grupos indígenas estão contra e afirmam que o projeto irá causar sérios danos a dezenas de milhares de pessoas - alguns dizem 20.000, outros 40.000 - que as irá retirar dos seus territórios e deixar as suas casas e atividades como resultado de inundações superfícies no banco atual do Xingu. A causa das vítimas potenciais de Belo Monte ganhou ressonância particular quando, na primavera do ano passado, James Cameron visitou a área afetada para apoiar os índios. O diretor, apoiado pela atriz Sigourney Weaver e o cantor Sting, escreveu uma carta a Lula onde recordou a mensagem de seu filme Avatar, onde uma civilização nativa corre risco de extinção devido à exploração de um mineral raro.
A suspensão da obra da barragem de Belo Monte coincidiu com greves e manifestações contra Evo Morales, em protesto contra a construção de uma estrada de 300 quilômetros que interessa tanto ao Brasil como à Bolívia. A via, em 80% financiada pelo Brasil, faz parte de um corredor entre o Atlântico e o Pacífico para facilitar o comércio entre o gigante da América do Sul e a China, o seu melhor cliente. As obras foram suspensas após a revolta popular, e Brasília aguarda uma solução para o conflito. Esta é outra guerra, mas o desafio é o mesmo.
Originalmente publicado no jornal espanhol (catalão) La Vanguardia, traduzido para Português
Brasil: Os Avatares da Amazonia
5.10.11
MobiGreen